Temas técnicos e complexos, quando discutidos por meio da mídia, abrem margem a vários tipos de sofisma: ou se levantam aspectos secundários do tema, como se fossem centrais, ou se fazem afirmações que se perdem no meio do alarido e não são conferidas.
A discussão sobre a transposição do rio São Francisco teve muito disso. Alegava-se que as críticas decorriam da falta de conhecimento técnico dos críticos. Mas a maioria dos trabalhos técnicos condena o projeto, pelos aspectos ambientais e socioeconômicos.
Algo semelhante vai ocorrer com essa discussão em torno da TV digital. De cada um dos lados haverá blefes, afirmações não comprovadas para tentar reduzir as vantagens relativas do outro padrão. A melhor maneira de esclarecer os pontos é colocar os donos dos padrões frente a frente.
Na coluna de hoje vamos colocar algumas afirmações dos representantes do padrão japonês para análise pelos representantes do padrão europeu:
1) Espectro
Japoneses: seu padrão (o ISDB-T) atende a todas as exigências brasileiras, usando apenas o espaço de 6 MHz no canal de transmissão permitido pelo governo brasileiro. Já os europeus precisariam de um canal extra para isso.
Europeus: dizem que os japoneses blefam. Sustentam que o seu sistema (o DVB) é flexível na hora de montar os aplicativos. No canal de 6 MHz seria possível alocar HDTV (alta definição), SDTV (a terceira melhor definição) e TV portátil. O padrão japonês tem um canal específico para móvel ou portátil. Segundo os europeus, seu sistema é diferente, pois o SDTV já é móvel. Exemplo: uma emissora poderia transmitir em HDTV, em MPEG4, ao mesmo tempo transmitir em SDTV, em MPEG2 (mais barato), além de transmitir mais de nove canais de outro conteúdo para celular. Tudo isso em 6 MHz.
2) Exportação
Japoneses: dizem que 90% dos componentes dos "set top boxes" (conversor) são os mesmos nos três padrões. Portanto um aparelho produzido no Brasil com tecnologia japonesa poderia ser exportado para a Europa ou os EUA mudando apenas um chip, o que não modificaria substancialmente seu custo.
Europeus: cerca de 30% do custo de um "set top box" se refere às questões tecnológicas -e não apenas 10%, como dizem os japoneses. E as soluções eletrônicas são integradas. Não é como um brinquedo de montar, em que as peças são mudadas da maneira que quiser. Se a afirmação do padrão japonês fosse realmente viável, dizem os europeus, eles mesmos já estariam exportando para o resto do mundo.
3) Incorporação de tecnologia
Japoneses: estão dispostos a abrir o padrão para que os brasileiros possam agregar tecnologia nacional. O padrão tem o suporte da Arib (Association of Radio, Industries and Business), que reúne 269 empresas japonesas para desenvolver as tecnologias aplicadas no padrão de TV digital.
Europeus: os europeus sustentam que o padrão japonês é o mais fechado. Todas as empresas do consórcio são japonesas, enquanto o consórcio DVB possui mais de 270 membros que incluem emissoras, indústrias, operadores de rede, desenvolvedores de softwares e órgãos de regulação, inclusive muitas empresas que operam no Brasil.
Mais pontos dessa discussão estão no seguinte endereço: www.projetobr.com.br